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Igreja Matriz

Quando da minha última viagem a Lagarto, não lhe disse adeus, que adeus é palavra que dói fundo. E eu não quero me apartar da minha infância e da minha adolescência. Nem da adolescência e da infância dos meus amigos. Limitei-me, pois, a dizer até breve. Simplesmente até breve, assim como um velho e impertinente apaixonado deve murmurar, no íntimo, nas amargas horas de separação. Até breve é a esperança, a crença na volta ansiosamente desejada. Alentadora expectativa de um alegre retorno. Jamais como acontece com o adeus, o doloroso e definitivo afastamento.

Quero voltar a Lagarto para rever, com os olhos da saudade, a bonita imagem de Nossa Senhora da Piedade. Não que a Igreja Matriz, onde ela fica, constitua uma obra de arte. É simples e despretensiosa. Foi lá, porém, que, pela primeira vez, vi um bispo de carne e osso. Um bispo muito bom e modesto. Era Dom Fernando Gomes dos Santos, segundo bispo diocesano de Aracaju.

Chegava da capital sergipana em um Lincoln. Automóvel tão novo, bonito e diferente que chamou a atenção de todo mundo. Bem diverso dos de Manoel dentista e do de Atenor. Dom Fernando chegou para a missa festiva em comemoração à festa da padroeira do município de Lagarto, Nossa Senhora da Piedade; ficou lá em cima, em uma cadeira especial, junto ao altar com sua mitra e o seu cajado.

A Igreja Matriz de Lagarto passara por uma grande reforma. Nela, como mestre de obras, trabalhava “seo” Reis, um lusitano. Como carpinteiro, Gervásio, com a sua mansidão e um grande charuto no canto da boca. E toda a comunidade lagartense, rural e urbana, a estimular o vigário local, um outro português, baixo e grosso de corpo, a cabeça grande, tinha a pele do rosto meio azulada.

Ele tinha a fama de rude – o vigário de Lagarto, o monsenhor João de Souza Marinho. Na verdade, era um grande coração. E com esse coração, ele lutou para remodelar o templo, substituindo grossas paredes por colunas pesadas, revestidas de escariolas e dando acentuado acréscimo a uma das paredes laterais do edifício. E os lagartenses, trabalhadores, orgulhosos de sua terra, forneceram os meios financeiros para custear todos os serviços.

A missa festiva que Dom Fernando celebrou, como as missas convencionais de todos os domingos, foi bastante concorrida. Dona Dulce Romero, presidente da União das Filhas de Maria, dava o máximo dos seus esforços e de sua fé para abrilhantar as festividades religiosas. O mesmo fazia sua irmã Canoca, diretora do coral, juntamente com outras senhoras mocinhas nos seus cânticos sacros, tendo como harmonista o Antônio Xisto.

Foi também na Matriz de Lagarto que conheci o Frei Eliseu, que foi o diretor do Museu do Carmo, em Salvador. Apareceu com um robusto frade holandês, pregando Santa Missão. Santa Missão que ocupava a todo mundo dia e noite, com pregações, novenas, crismas, passeios ao Campo da Vila. E houve até uma polêmica, na casa de Atanásio, com alguns protestantes, que não passavam de minoria. No dia do debate com o Frei Eliseu, que mobilizou toda a população, o Monsenhor João de Souza Marinho fez esta observação: “É mais fácil convencer um sábio que um ignorante”. Para ele, os protestantes tinham a cabeça dura.

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