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8 de Julho

O dia 8 de Julho, que no calendário da história representa, como formal, a Emancipação Política de Sergipe, não passa, atualmente, de simples feriado. Não há, lastimavelmente, qualquer manifestação cívica que evoque a data, permitindo aos mais novos preservar a conquista da liberdade e da sergipana. Graças ao 8 de Julho, Sergipe organizou a sua vida econômica, formou a sua administração e viu florescer a vida nas vilas e povoações, que continuadamente cresceram, abrigando uma população que hoje é de cerca de um milhão e trezentas mil pessoas, unidas por características de semelhanças, tanto no que diz respeito às carências como naquilo que se refere aos sonhos e anseios.

Todo povo tem uma data, um dia, pelo qual vê refletida a imagem do passado. Nos países mais adiantados, os avanços ainda não conseguiram alterar o respeito e o interesse que as efemérides nacionais impõem como marcos. O 4 de Julho, nos Estados Unidos, o Dia da Independência, e o dia 14 de Julho, na França, que lembra a Queda da Bastilha, são datas símbolos, que tanto são caras aos povos dos dois grandes países, como se projetam na história da humanidade, como portadores de valores que são comuns a todos os povos, como a liberdade e a justiça. O 8 de Julho, como o 24 de Outubro, é uma data especial para Sergipe e para os sergipanos, que não pode figurar apenas como feriados nas Constituições, mas, antes, devem marcar o compromisso feito pela história.

Diversos historiadores deram, em extensa bibliografia, notícias substanciais sobre os fatos que levaram à desanexação do território sergipano, em 3 de julho de 1820, acabando com a sujeição à Bahia. A emancipação não foi produto apenas da Carta Régia, mas de uma luta árdua, muitas vezes desigual, entre partidários da reanexação e partidários da autonomia. Foram mais de três anos de lutas, até que prevaleceu a Emancipação, com a consequente instalação da Província, com o governo próprio, acelerando o progresso de Sergipe, cuja continuidade tem permitido, no tempo, garantir aos sergipanos uma existência criadora, inteligente, inventiva, a ponto de ser, na região nordestina, singular em muitos aspectos, especialmente no cultural.

Desde 8 de julho de 1820 que se constrói, em Sergipe, uma trajetória de efeitos que formam um imenso cabedal, que serve de referência aos novos que têm a responsabilidade de levar adiante o processo de evolução do Estado. Esse patrimônio, do qual parte se pode ver nas regiões sergipanas e parte reflete a alma do povo, é o maior e mais precioso legado que o tempo traz às novas gerações, como testemunho do empreendimento que tem sido produzido pelo trabalho, pelo suor e pelo sacrifício das gerações ancestrais. Cabe a cada sergipano, do litoral ao sertão, da foz do Rio São Francisco à foz do Rio Real, das fronteiras com a Bahia e com Alagoas, um quinhão desse fruto que a história tornou possível, há 178 anos, e que parece ser tão novo e tão recente quanto o sol que cobre de luz e calor, diariamente, esse pedaço de terra.

Não se pode, portanto, renegar esse passado, muito menos o que foi possível construir ao longo do tempo. A falta do amor cívico, decorrente da mais desconcertante desagregação social da vida brasileira, não pode ser estimulada pela ausência de celebrações ao Dia de Sergipe. É preciso recuperar a importância dos fatos da história, antes que eles também naufraguem, como náufragos estão muitos dos valores que antes agregaram a sociedade brasileira. Não se deve permitir a deterioração de tudo o que existe de mais próprio e de mais significativo para gênesis e para a evolução de um povo. O 8 de Julho é um desses casos, porque, mais do que uma data relevante da história, é um símbolo pela garra, pela combatividade, pela consciência política de muitos. E se não somos capazes de criar novas expectativas venturosas, que sejamos ao menos fiéis depositários das conquistas velhas, que trazem o cheiro da valentia dos nossos antepassados.

O Significado do 8 de Julho

“Convindo muito ao bom regime deste Reino do Brasil e à prosperidade a que lhe propondo elevá-lo que a Capitania de Sergipe del Rei tenha um governo independente da Capitania da Bahia[…]”.

Assim começava a Carta Régia, de 8 de julho de 1820, com a qual D. João VI encerrava uma página da história de Sergipe, iniciativa com a criação da Capitania da Bahia de Todos os Santos, em 1534, doada a Francisco Pereira Coutinho.

Realmente podemos considerar o 8 de Julho como a data maior de nosso passado histórico. A partir daí, Sergipe se tornava uma Capitania autônoma, com presidente substituindo os capitães-mor, em sua maioria, responsáveis por atos de prepotência e situações vexatórias. As rivalidades entre estas autoridades e os ouvidores eram constantes, e, em torno delas, se dividiam os senhores de terra, o que tumultuava a vida da região. Alguns dos capitães-mor foram exceções, como Mesquita Pimentel, que, em 1809, já se dirigia às autoridades reais, mostrando como seria importante a separação de Sergipe do Governo da Bahia para melhorar a vida de seus habitantes, pois “dessa subordinação e semelhantes princípios demanda a decadência desta capitania, fazendo com que os sergipanos vivam como desalentados, em desconsolação”.

Acreditamos que a Carta Régia de 8 de julho de 1820 tenha decorrido da prosperidade econômica que Sergipe vinha alcançando nas primeiras décadas do século passado, especialmente no setor açucareiro, desde quando, em 1824, já contava com 226 engenhos. A esta situação de prosperidade associou-se a reforma político-administrativa encetada pelo governo real, dividindo capitanias, como acontecera pouco antes com a de Alagoas, que se separara da de Pernambuco. Mas não foi fácil fazer vigorar a autonomia ganhada pelos sergipanos em 8 de julho de 1820.

O primeiro presidente, Carlos César Bulamarqui, nomeado em 25 do mesmo mês de julho, só tomou posse em 20 de fevereiro de 1821. Governaria menos de um mês, pois, em 18 de março, era deposto por tropas vindas da Bahia, a mando da junta Governativa que lá se instalara após o levante constitucionalista de 10 de fevereiro. A essas tropas se associaram outras comandadas por alguns senhores de terras locais.

Procurou a Junta Governativa anular a Carta Régia de D. João VI de 8 de julho de 1820, o que foi ratificado pelas cortes portuguesas reunidas em Lisboa, às quais passara a obedecer em atitude de rebeldia aos atos do príncipe regente D. Pedro.

Apesar de, aparentemente, aceita a autoridade do governo nomeado pela Junta em substituição a Carlos César Bulamarqui, muitos não concordaram com a situação, permanecendo um sentimento de revolta, um espírito de luta pela autonomia sergipana, que iriam confundir-se com a participação de Sergipe no processo de independência nacional.

Assim, foi fácil a atuação de João Dantas dos Imperiais de Itapicuru e de Pedro Labatut para que Sergipe aderisse à orientação do príncipe regente, e que os sergipanos dessem sua contribuição às tropas libertadoras que, triunfantes, encontram-se em Salvador no dia 2 de julho de 1823.

Em 1º de outubro de 1822, a Câmara de São Cristóvão, onde sempre permanecera um sentimento abafado de independência, fez a aclamação de D. Pedro como príncipe regente. Ainda não havia chegado a notícia de proclamação de independência no Brasil, só conhecida de Labatut nos fins daquele mês.

No momento da aclamação, o representante da tropa e do povo, o major Cristóvão de Abreu Carvalho Contreiras, solicitou a organização de uma Junta Provisória que deveria pôr em execução o Decreto Régio de 8 de julho de 1820, desligando efetivamente Sergipe da Bahia. Havendo uma oposição a essa proposta, respondeu o major Cristóvão de Abreu Carvalho que “à tropa e ao povo não convém demora alguma e queriam que já se instalasse o governo, que há tanto é por todos desejado, e que a tropa estava firme no lugar em que estava postada, da qual protestava não mover-se enquanto o governo não fosse de pronto instalado, e que a tropa estava com as armas carregadas e balas em cartuxames”.

Ante tal atitude decidida, e o temor das tropas que, do Sul, vinham comandadas por João Dantas dos Imperiais Itapicuru, e, do Norte, pelo general Labatut, se unem às facções em que se dividiam os senhores da terra, e elegem uma Junta provisória, comunicando o fato às autoridades de Cachoeira, ressaltando que ficava “observado o Decreto de Sua Majestade, o Senhor D. João VI, de 8 de julho de 1820”.

Em 5 de dezembro desse ano de 1822, Pedro I, por Carta Imperial, confirmou o Decreto de D. João VI, encerrando-se, assim, o processo iniciado em 8 de julho de 1820, consolidando Sergipe sua autonomia.

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