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Brincadeiras de um menino lagartense: passeio ao sítio da vovó

dia-dos-avos1 Brincadeiras de um menino lagartense: passeio ao sítio da vovó

Depois das Brincadeiras de “BOI DE BARRO”, “BOLA DE MARRAIO”, ”FURÃO” e “ARRAIA”, venho agora lhes contar as histórias de como eram os PASSEIOS nos dias de verão de um menino lagartense, que, apesar de não utilizar, como as anteriormente citadas, de qualquer instrumento, a não ser as pernas e as mãos ágeis de cada um, para caminharem e subirem nas árvores frutíferas. De qualquer forma, Constituíam-se em verdadeiras brincadeiras.

A primeira, entre outras que pretendemos contar, trata-se do ”PASSEIO AO SÍTIO DA MINHA AVÓ”, mãe do meu pai, que morava no povoado Horta e era conhecida como Dona Santa, e os seus netos a chamavam, carinhosamente de “Mãe Santa”. Na verdade, o nome dela era Lídia Maria de Jesus.

Quando os nossos pais anunciavam que iríamos para o sítio de Mãe Santa, a alegria era geral e, imediatamente, vestíamos o nosso short de elástico e camiseta simples, calçávamos o nossos tamancos ou alpercatas de couro cru e já ficávamos prontos, eu e meus irmãos, pois gostávamos muito do passeio e já nos divertíamos, desde o início do trajeto que começava a partir da Igreja do Rosário, pois morávamos na Rua Floriano Peixoto e descíamos pela Rua Laranjeiras seguindo pela antiga estrada real e, logo em seguida, entrávamos à direita e descíamos por um corredor que dava para uma região de mata fechada, ouvindo o cantar de alguns passarinhos e zumbido intermitente das cigarras. Prosseguindo por esse corredor estreito e sombrio, ficávamos observando nas suas margens as enormes depressões, que na época, aos nossos olhos de menino, todo aquele cenário, causava-nos uma sensação de medo, mas que era atenuado, pela explicação do nosso pai, João Nogueira, que sempre nos guiava, explicando-nos que aquelas depressões “teria sido causada pelo dilúvio nos tempo de Noé”.

Quando se aproximava da chegada ao sítio, corríamos em direção à cancela que dava entrada ao mesmo e, abrindo-a, a soltávamos, esperando ouvir o batido da mesma no mourão e assim continuávamos a correr em disparada, em direção à casa da minha avó, que ficava a cinquenta metros da cancela, a fim de ver quem seria o primeiro a dizer “A benção Mãe Santa”!

Mal pedíamos a benção da nossa avó, já saíamos em disparada, novamente, direto ao primeiro pé de frutas que encontrássemos à nossa frente, e eram geralmente, a partir de dezembro de cada ano, que cajueiros, mangueiras e jaqueiras estavam cheios de frutos maduros, convidativos para serem comidos à vontade.

Das frutas que nós, particularmente, mais gostávamos, era a jaca mole, que comíamos em cima da jaqueira, trepados em algum galho mais grosso e ficávamos comendo os seus bagos e jogando para baixo os caroços nos irmãos que ficavam embaixo e não podiam ou não conseguiam subir na jaqueira. Depois de comermos as jacas e separarmos algumas para levar, chupávamos alguns cajus traventos e, em seguida, algumas mangas espadas, quando as encontrávamos, mas sem antes pegarmos uns talos nos pés de café, que abundavam às sombras das jaqueiras, para fazer uma enfileira de cajus, como uma forma prática de levarmos esses frutos para casa.

Além da jaca mole, da manga e do caju, gostávamos, em especial, de chupar jabuticabas, que por sua natureza, só brotavam nos verões e, mesmo assim, com raridade, o que dificultava o seu consumo, pois tínhamos que ficar esperando o dia certo, quando as elas ficassem amadurecidas, no ponto para serem consumidas. E assim, quando tínhamos a notícia que as jabuticabas estavam maduras, todos nós íamos ao sítio da nossa “Mãe Santa” comer as jabuticabas e, a ansiedade em comer essas frutinhas rajadinhas, quase escuras, era tão grande, que quase sempre, algum dos irmãos, acabava ficando “entupido” pelas sementes, apesar da advertência que um ou outro dos nossos irmãos fazia: “Não coma muito porque pode entupir”! Mas entre nós, uma irmã gulosa dizia: “Só paro depois de arrotar três vezes”! Naturalmente, ela era a candidata que, com certeza, ficaria entupida.   Mas nós tínhamos uma tia do meu pai, que chamávamos de “Madrinha Cândida”, que tinha a solução para esses casos de entupimento, através de uma pequena cantiga ensinada por ela, a qual deveria ser entoada por quem estivesse ”entupido”, e na hora de defecar, utilizava-se a palma da mão e, compassadamente batia-se na bunda cantando até desentupir, assim:

Caga cú,
É tempo de umbu,
Fazendo umbuzada,
Prá dentro do cú!

Era um santo remédio.

Comia-se tanto, que ficávamos de barriga esticada e toda lambuzada de manga e visgo de jaca nas mãos e nos lábios que só saía passando um pedacinho de toucinho de porco que a nossa avó nos dava depois da comilança.

O Problema era quando, à noite, já em casa, sentíamos uma sensação de “barriga inchada”. Então, começávamos a nos queixar com a nossa mãe D. Julinha: Cada um reclamando, “estou arrotando ruim”.  Diante dessas reclamações, a nossa mãe dizia: “O jeito é tomar óleo de rícimo!”, o qual, como todos sabem, é difícil de engolir, mas, o nosso pai colocava à nossa disposição, um copo com óleo de rícimo e, ao lado, uma tampa de laranja para chupar logo depois de ingeri-lo e também um cinturão dobrado para quem não tomasse direito o remédio. Ninguém escapava!

2 comments

Marco Aurélio

Rapaz, minha avó sergipana (de Lagarto, depois Estância), cujo sobrenome de solteira era Góis de Jesus, cantava essa música aí pra criança entupida!

José Edvaldo Dias de Souza

Paulo,
Tudo isso aconteceu comigo exatamente como está descrevendo!
Incrível, poder voltar ao tempo com suas histórias!

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